Querido
filho!
Estou
a escrever esta carta devagar, porque sei que não
sabes ler depressa.
Já
não vivemos onde vivíamos quando foste
embora. O teu pai leu no jornal que "a maior
parte dos acidentes dão-se a 20 km de casa",
por isso mudámo-nos.
Eu
não te posso enviar a nova morada porque
a última família a morar aqui levou
os números da porta, para que não
tivessem que trocar de morada.
Este
lugar é espetacular, até tem uma máquina
de lavar roupa. Eu acho é que não
está a funcionar muito bem: a semana passada
eu pus-lhe roupa, puxei a correia e nunca mais a
vi desde essa altura.
O
tempo aqui não é mau. Esta semana
só chuveu duas vezes: a primeira durante
3 dias e a segunda 4.
Quanto
áquele casaco que tu querias que eu te enviasse,
o teu tio João disse que ficava muito pesado
com os botões, por isso eu tirei-os e meti-os
no bolso de dentro.
Ontem
o Manuel trancou o carro com as chaves no interior.
Ficámos mesmo preocupados, porque ele esteve
duas horas para nos tirar do carro, a mim e ao teu
pai.
A
tua irmã teve um bébé esta
manhã. Ainda não descobri se é
menino ou menina, por isso não te sei dizer
se és tio ou tia. É tão parecido
com o teu irmão...
O
tio Joaquim caíu no tanque de whiskey, a
semana passada. Alguns homens tentaram tirá-lo
de lá, mas ele lutou até à
morte. Foi cremado e ouve um incêndio que
durou 3 dias.
Três
amigos teus caíram de uma ponte numa pick-up.
O Francisco, que ía a conduzir, abriu a janela,
saíu e nadou até à margem em
segurança. Os teus outros dois amigos íam
atrás. Eles afogaram-se porque não
conseguiram descer a porta de trás.
Não
tenho mais nada para dizer neste momento. Aqui não
acontece nada de especial.
Beijinhos,
Mãe
P.S.
Ía-te enviar algum dinheiro, mas o envelope
já estáva fechado.